Por Seth J. Frantzman – Gershom Gorenberg discute o que ele interpreta como tendências não democráticas [em Israel NT] e o que pode ser feito em relação a elas.

Gershom Gorenberg não faz rodeios na abertura de seu livro mais recente, The Unmaking of Israel , declarando que “a contínua promoção do extremismo religioso, a erosão da lei pelo próprio governo, tudo ameaça o futuro de Israel. Em particular colocam sua aspiração à democracia profundamente em risco.”

Gorenberg não é da cansada velha escola de intelectuais israelenses que afirmam que seu Estado foi seqüestrado por outros. Em vez disso ele vê nuances, argumentando que os assentamentos na Cisjordânia foram geralmente estabelecidos por políticos seculares e que, em alguns aspectos, o país tornou-se mais democrático desde a guerra de 1967. Mas, como Jeremy Ben-Ami, Hirsh Goodman e muitos outros que têm publicado livros recentemente, ele teme pelo futuro do país se seguir pelo seu caminho atual.

O autor cresceu na Califórnia e chegou a Israel em 1977 aos 22 anos. Depois de completar um Mestrado na Universidade Hebraica de Jerusalém, começou a trabalhar como jornalista. Agora vive em Jerusalém com sua esposa e três filhos, já foi co-autor de Shalom friend: The Life and Legacy of Yitzhak Rabin, e autor de The End of Days: Fundamentalism and the Struggle for the Temple Mount (2000) e O Império Acidental: Israel e o nascimento dos Assentamentos, 1967-1977 (2005). Ele se reuniu com o Jerusalem Post recentemente para discutir o seu último volume.

O que você espera conseguir com este livro?

O livro pretende ser um aviso sobre os perigos para o futuro de Israel como um Estado e uma democracia. Vejo uma série de desenvolvimentos que eu senti – que mesmo que eles estejam sendo cobertos pela imprensa local e do exterior, a natureza da cobertura diária faz com que as pessoas não vejam o quadro mais amplo.

Propus-me a criar uma imagem, aquela mais exata que eu poderia, sobre por que essas tendências se desenvolveram e o que poderia ter sido feito com elas. O livro está destinado a pessoas que estão preocupados com Israel [e] gostariam de ver um Israel florescente, democrático. Em particular, um dos desenvolvimentos… que foi uma faísca para [escrever o livro] é a questão da autoridade do Exército sobre seus soldados, e [o fato] que a autoridade eleita pelo Governo para comandar os soldados está sendo contestada pela extrema direita religiosa.

Esta questão, e o sucesso para superá-la, começou com o primeiro Primeiro Ministro de Israel, David Ben-Gurion, o uso da força no caso Altalena [em que 19 judeus foram mortos após que a IDF bombardeou o navio que transportava armas para o Irgun ], assegurando que somente o Governo iria ter o controle militar e não facções políticas. Para ver que o que está sendo corroído é uma questão séria.

Têm havido uma onda recente de livros sobre o futuro de Israel, como The Anatomy of Israel´s Survival de Hirsh Goodman. Onde é que seu livro se encaixa?

Uma grande quantidade do que eu achei é material que era confidencial, ou tinha passado despercebido.

Para The Accidental Empire, usei material que previamente era de acesso reservado. Parte do material … eu recebi depois de ter solicitado para ter acesso aos arquivos das IDF. Eu aprendi que alguns dos primeiros assentamentos foram criados no modelo Mapai pré-Estado, que era “não fale em absoluto e leve uma enxada grande”.

Por exemplo, Kfar Etzion [um kibutz religioso que existia antes de 1948, que os jordanianos destruíram naquele ano; foi restabelecido em 1967 pelos filhos dos membros originais] foi mal interpretado como um posto avançado do Nahal e não como um posto civil. Ao governo foi dito [pelos seus próprios conselheiros] que estabelecer assentamentos violava o direito internacional. O público em 1967 [também] não sabia que um grupo de kibbutzniks seculares tinha ido para o Golan apenas algumas semanas após a guerra [e começaram a estabelecer assentamentos lá].

Eu acho que existem fortes indícios para mostrar que [o ex-primeiro-ministro Ariel] Sharon esteve envolvido em incentivar as pessoas a criar estes postos avançados, de modo que o que aparentam ser desafios ao Governo por parte de grupos extremistas precisa ser melhor descrito como uma parceria entre forças de dentro do Governo e os colonos radicais.

Defendo que em contraste com os Pollyanna-ish hasbara -niks [comentaristas pró-Israel], ou as pessoas que dizem que o Estado foi antidemocrático desde o início, eu vejo uma real, embora muito imperfeita democracia, desde o início [da existência do país]. No contexto histórico, tanto as falhas como as realizações precisam ser vistas. Vendo as falhas, pode-se compreender mais claramente o que se saiu do trilho desde então.

Por exemplo, a forma de ultra-ortodoxia [que agora existe no país] foi criação, com conseqüências imprevistas, do próprio Estado. Eu também argumento que o que aconteceu nos territórios ocupados depois de 1967 foi uma tentativa de aplicar métodos pré-estatais do Movimento Sionista nas novas terras, [mas] em vez de construir um Estado, eles o estão desmontando – eles ignoram um divisor de águas crítico para a criação do Estado. O resultado é que ao invés de avançar, estamos voltando para trás.

Você se concentra muito no movimento de colonização e nos assentamentos na Cisjordânia, em particular sobre os “jovens da colina” e nos postos avançados. Por que os colonos lhe preocupam tanto?

O efeito dos assentamentos em curso na Cisjordânia é a indefinição das fronteiras do Estado e de quem pertence à entidade governada, bem como mina o Estado de Direito. … Há uma narrativa sobre o desenvolvimento dos assentamentos, que mapeia o conflito dentro da divisão religioso-secular. A história padrão repetida na cobertura de Israel é que os assentamentos começaram com governos seculares relativamente moderados que não tinham força de vontade, sendo arrastados pelos movimentos religiosos extremistas. Descobri que isso não se alinha com os fatos. Desde o início, muita, se não a maioria, da iniciativa veio do governante alinhamento do Partido Trabalhista, que fez parceria com colonos religiosos e ao fazê-lo de fato estimulou o crescimento de colonos da direita religiosa.

Você menciona neste livro que a empresa dos novos assentamentos a partir de 1967 foi uma concessão “não natural” que deu vida nova para o estilo pré-Estado de assentamento. Como sabemos tão bem onde traçar a linha? Um dia, o Estado está confiscando a terra dos árabes ausentes dentro da Linha Verde ou construindo assentamentos Nahal, então eles estão fazendo isso no Golan e na Cisjordânia. Então, por que os colonos têm que ser vistos como não naturais, mas o que aconteceu poucos anos antes de 1967 ser considerado bom?

Mesmo em termos do que aconteceu depois que o Estado foi criado, não é que o período 1948-1967 foi homogêneo. Houve uma explosão de criação de novos assentamentos após a criação do Estado. Em termos do movimento kibutziano, foi bem menos sucedido do que os kibutzim pré-Estado. Na década de 1960, isso foi diminuindo. De fato, em 1967, havia grandes planos para enxugar a Divisão de Assentamentos da Agência Judaica.

Em termos de uso da terra, a atitude do Estado em direção à minoria árabe em Israel foi uma na qual o Estado não tinha feito uma transição de um movimento para os judeus em direção a um de responsabilidade por todas as pessoas no Estado. Mas o fato de que os árabes [dentro da Linha Verde] tinham o voto é o que criou a pressão política para liberá-los do governo militar em 1966. Depois de 1967, você tem uma grande população de árabes que vivem sob governo militar [na Cisjordânia e Gaza], mas não se concede cidadania para [aqueles] árabes. A “solução” foi que os judeus que se instalaram nos territórios eram tratados como se vivessem dentro de Israel, em termos de estatísticas do Governo e de votar [enquanto os árabes que viviam nessas áreas não foram].

Você menciona os árabes que se tornaram “ausentes presentes” em Israel depois de 1948. Estes são os que fugiram de suas aldeias e, no entanto, acabaram indo morar em Israel como o que alguns chamam de “refugiados internos”. Você menciona um número para eles de 75.000 em 1950, que teria sido a metade da população árabe na época, o que significa que metade dos árabes do país hoje fazem parte desta categoria. Isso parece um exagero enorme.

Apresento isso como uma estimativa. Eu acho que é concebível que um em cada dois foi deslocado dentro de Israel. Mais pesquisas são necessárias. Por exemplo, parte das pessoas que vive em Akko depois de Maio de 1948 foram pessoas que viviam ali antes, mas por outro lado, houve pessoas que fogem para a cidade. Há histórias semelhantes em Taiba e em Nazaré.

Outra questão que lhe preocupa dentro da Linha Verde são os ataques à democracia de Israel. Você escreve que os comitês de aceitação de mais de 1.000 comunidades aqui devem ser “remetidos para os livros de história.” O que há com as comissões de aceitação do kibutz? Toda vez que eu perguntei se elas são semelhantes, as pessoas dizem que o kibutz é especial – de alguma forma-, e que os comitês de aceitação de todas as outras comunidades são racistas.

Já ouvi histórias ao longo dos anos de kibutzim tomando decisões questionáveis sobre o quadro social. A diferença entre um kibutz e o yishuv kehilati [assentamento comunal] é que no kibutz clássico se aceita novos membros como [parceiros] econômicos, e é mais intensamente comunal. Isso não significa que não havia kibutzim discriminatórios. Mas a justificativa essencial era sobre eles serem parceiros econômicos.

Ao dar essa resposta, não estou comentando sobre a questão da discriminação. O que aconteceu foi que um modelo que tinha alguma justificativa para uma circunstância foi aplicado noutra. Na medida em que algo é apenas um subúrbio [como é o caso dos kibutzim privatizados], não deveria ter um comitê de aceitação.

Em sua conclusão, com a sua discussão de “separação de sinagoga e Estado” e ao citar o lema dos EUA “todos os homens são criados iguais”, você parece apoiar a criação de um mini-América, em Israel, com algumas modificações. É esse o caso?

O aspecto da forma americana de democracia que estou defendendo é a separação entre Igreja e Estado. Eu não sou um daqueles imigrantes norte-americanos que pensa que só porque foi feito lá, isso deve ser feito aqui. Eu rejeito a idéia de uma Constituição. Eu não sei se a Constituição se tivesse sido adotada em 1949 ou hoje seria bom para a democracia, na verdade, seria institucionalizar problemas. Eu acho que um sistema parlamentar tem muitas vantagens. A idéia de “todos os homens criados iguais” vale a pena de ser seguida, mas deve ser diferente.

Dado tudo o que você tem escrito e visto ao longo dos anos, está otimista quanto ao futuro?

Eu não estou fazendo nenhuma previsão. Isso é uma coisa que eu aprendi [depois] de estar em Israel por tanto tempo.

Tradução livre do inglês para o português: Alberto Milkewitz